As relações maternais são, possivelmente, as mais intrínsecas e resistentes do ser humano. Um elo que transcende idade, criação e, na maioria das vezes, até mesmo as mais árduas circunstâncias.
Partindo desse pressuposto nasce uma dúvida: o que é, de fato, ser mãe? Em Mães de Verdade, de Naomi Kawase, embarcamos em uma jornada que paraleliza passado e futuro na busca de uma resposta menos objetiva e mais abrangente para esse questionamento.
O filme conta duas histórias que se cruzam justamente na maternidade e, enquanto Sakoto e Kiyokazu Kurihara ansiosamente desejam um filho e optam por seguir o caminho da adoção, a jovem Hikari Katakura tem de lidar com os problemas advindos de se engravidar na adolescência e enfrenta o duro rompimento afetivo ao entregar seu filho para o casal.
Sempre utilizando uma câmera que evoca a poesia entre as idas e vindas da montagem, uma vez que constrói todo seu impacto através dessa não linearidade, o filme deixa de ser um retrato sentimental e apela para uma extorsão de significado com imagens vaidosas que não incorporam a narrativa. Nelas, insistentemente se repete e se resume visualmente a parecer um grande comercial de câmeras de celular.
Kawase não tem muito controle sobre o seu produto e isso fica claro na sequência em que Hikari chega no Baby Baton, quando ela rompe o pouco aconchego que a protagonista tem em meio ao realismo para investir em um enxerto documental. A diretora subestima o espectador ao deliberadamente transitar entre gêneros apenas para explicar a sensibilidade dos atos e da vivência dessas mulheres naquele local. As conversas, antes naturais e provenientes de uma intimidade situacional, se tornam relatos que, mesmo que não tão polidos, rompem a delicada película da construção ficcional.
Embora a temática familiar que sempre confronta vivências lembre muito Assunto de Família (Hirokazu Koreeda, 2018), todo o segmento de Hikari e a maneira que ela lentamente vai afundando sob si mesma tem muito de Só Deus Sabe (Benny & Josh Safdie, 2014). Todavia, Mães de Verdade tanto não tem a mesma sensibilidade e precisão do diretor japonês ao se tratar desse trânsito entre perspectivas, quanto não consegue exprimir cinematograficamente a agonia de uma protagonista que foi completamente desamparada como fazem os irmãos nova iorquinos.
Da mesma forma, ela evoca no texto uma conexão com o ambiente que não acontece fora das imagens que situam as personagens ou que insistentemente tentam usar paisagens como sinônimo de profundidade. Já no trabalho da dupla estadunidense não há o abuso de planos abertos (isso se houver de fato algum no filme) e essa conexão se revela muito mais sofisticada através dos seres e não o contrário.
O filme tem muita noção que o seu tema, socialmente falando, pode alavancar um cunho sentimental e prefere se resumir ao criar a sobreposição de acontecimentos que possam extrair emoção à força do espectador na edição. Sem trazer para as personagens mais do que é necessário para contar sua história, Mães de Verdade não só falha em encarar a maternidade como algo mais amplo do que a biologia como também abusa de clichês na esperança de gotejar lágrimas da audiência.
Em suma, o filme é uma obra muito unilateral que, no total contrário das referências aqui citadas, pouco acontece fora de um roteiro que nem ao menos é tão sofisticado quanto acredita.