Dentro dos gêneros cinematográficos é bem comum vermos uma flutuação de estilo. Na ficção científica, por exemplo, o leque é bem amplo e enquanto filmes como Ela (Spike Jonze, 2013) resvalam no romance, O Enigma de Outro Mundo (John Carpenter, 1982) está muito mais para terror. Essas variações quase sempre tem um resultado interessante, mas, infelizmente, acabam segregando certas vertentes de cinema. Por mais que filmes como O Halloween do Hubie façam um uso interessante dessa prática, a comédia quase nunca recebe esse olhar aprofundado por parte da crítica no seu desenrolar narrativo.
Acompanhamos a história de Hubie Dubois (Adam Sandler), um homem com uma leve deficiência mental que tenta garantir que todos tenham um halloween seguro. Aqui, o filme não se limita só a atrelar a sua comédia com um outro gênero, seguindo a escola de Esqueceram De Mim (Chris Columbus, 1990), ele se liga com toda uma concepção de data comemorativa.
Embora diversas outras obras de humor implementem essa mesma técnica, raramente vemos esse plano de fundo sendo usado além do sentido estético. Felizmente, esse não é o caso, já que o filme é muito bem recortado para a sua proposta e que, se analisado fora de uma série de pré concepções, têm bastante a oferecer. Uma estrutura que lembra muito os especiais de halloween dos Simpsons, abrindo bastante o enredo só para se fechar dentro de sua própria mitologia.
Não é só um filme que se passa no Halloween, é um filme sobre o Halloween, na realidade, ele sabe usar bem os clichês de terror para brincar com o espectador e ambientar bem a data. Mesmo que sua tensão e uso na narrativa sejam constantes, os principais antagonistas estabelecidos não oferecem nenhum risco. Em contrapartida, o vilão é a figura mais inofensiva possível, que não tem um ideal maléfico e só possui um senso de justiça e punição deturpado. Um uso bem interessante que muda a ótica do mal cinematográfico para o mal social.
Tendo dito isso, o filme não consegue esse mesmo êxito na hora de trabalhar com a matéria prima da comédia: as piadas. Dá para notar uma certa divisão entre dois focos, já que, ou elas são muito adultas ou muito infantis e acabam sem se conversar. Fora isso, também há um exagero que prefere atirar para todo lado ao invés de priorizar uma única e certeira fonte de graça.
Pode-se dizer que enquanto as convenções de terror são bem articuladas dentro da narrativa, isso não acontece com a parte cômica que, por sua vez só repete mais do que já se espera de um filme de Sandler. Por mais que Hubie seja simpático e você crie uma certa empatia, fica difícil de não reparar no quanto o ator não se esforça mais do que mudar brevemente seu jeito de falar. Tanto ele quanto o produto final são muito mais engraçados quando não estão tentando e faltou acompanhar essa riqueza com os diálogos.
Voltando na estética, particularmente a fotografia, que em planos mais abertos remonta um imaginário horripilante e caricato, funciona muito bem. Os quadros amplos parecem um cenário de revista pulp, abusando do gênero para construir seu visual. O milharal, o porão, a casa mal assombrada, as ruas pouco iluminadas, o porto e a própria cidade de Salem tanto visual quanto conceitualmente enriquecem demais a experiência e dão o tom medonho certo para a história.
Por fim, O Halloween do Hubie é um destaque tímido dentro dessa lacuna entre categorias. Um filme que teria tudo para ser um clássico dos anos 80, mas que infelizmente foi feito em 2020. Mesmo assim, é uma boa diversão de fim de noite com valores legais ensinados da maneira mais esquisita possível.